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28 Março 2010

No fim, era difícil ter encontrado notícia melhor. O debate está aí, espalhado um pouco por todo o lado, dos media oficiais à blogosfera, das redes sociais às conversas de club-house: será mesmo o The Masters Tournament, marcado para a próxima semana, a prova ideal para o regresso de Tiger Woods à competição, escassos quatro meses e meio depois do mega escândalo sexual em que o número 1 do ranking mundial de golfe se envolveu? Os factos, porém, são simples. Da última vez que Tiger esteve ausente, entre Junho de 2008 e Fevereiro de 2009, as audiências televisivas de golfe caíram cerca de 36 por cento – e, num momento em que a crise económica continua a afectar gravemente os sectores económicos que mais generosamente a patrocinam, seria uma tontice da parte de uma indústria que vive para (e “da”) televisão condescender com a ausência da mais brilhante de todas as suas estrelas.

Por detrás da opção de Tiger pelo regresso no The Masters, é fácil percebê-lo, estarão três razões fundamentais. A primeira terá a ver com a ligação sentimental que há muito une o jogador ao torneio, palco da sua primeira vitória no Grand Slam (um arrasador –18 obtido em 1997, com 12 pancadas de vantagem sobre o segundo classificado), entre outros três triunfos épicos. A segunda estará de alguma forma relacionada com a protecção que, apesar de tudo, o campo do Augusta National lhe permitirá, vistas as limitações de circulação sempre ali colocadas aos profissionais dos media, televisões incluídas. E a terceira, naturalmente, resultará da própria urgência de Tiger em regressar aos fairways, de forma a reconquistar a confiança dos patrocinadores, o apreço do público e, feitas as contas, o seu lugar como mais amado golfista da actualidade.

Resultado: ganha quase toda a gente. Para o The Masters, e apesar das denúncias de que Tiger acabará por utilizar o mais mítico torneio americano em proveito próprio, a simples presença do número 1 do mundo será um espectáculo suplementar como era difícil encontrar outro. Para as autoridades que superintendem o golfe norte-americano (e mundial), será um alívio, tendo em conta que este ano há Ryder Cup – e que, aliás, durante a última ausência de Tiger, a própria FedEx Cup terminou sombria e especialmente desinteressante (apesar do bom duelo entre Vijay Singh e Camilo Villegas). Para as televisões, incluindo a CBS e o Golf Channel (e mesmo, em Portugal, a SportTV Golfe), será uma oportunidade única de, mesmo cedendo a algum voyeurismo, reconquistar as atenções e o culto que de alguma forma ameaçava começar a escoar-se, particularmente nos Estados Unidos.

As previsões são pouco menos do que épicas. Depois de mais de seis milhões de americanos terem acompanhado em directo a conferência de imprensa em que o jogador pediu formalmente desculpas pelo seu comportamento (ver cronologia), é esperada para o The Masters uma audiência consolidada apenas comparável, nos últimos anos, às ocorridas em torno da vitória eleitoral e da tomada de posse de Barack Obama. Nem sequer o apertado controlo das autoridades da Geórgia, aliás, deverá ensombrar esse triunfo. É mesmo possível que os jornalistas e os comentadores da CBS e do Golf Channel evitem quaisquer referências ao escândalo em que o jogador se envolveu, contribuindo declaradamente para um clima de paz em torno de Tiger. E há até quem admita que a CBS, detentora dos direitos de transmissão dos dois primeiros dias do torneio, nem sequer passe imagens da primeira ronda de Tiger, no caso de o jogador actuar ao início da manhã. A sua presença no field será suficiente.

Os colegas, e apesar de uma ou outra voz dissonante, parecem entretanto prontos a receber de braços abertos o seu líder. Para além de rivais como Phil Mickelson ou Jim Furyk, de homens imprevisíveis como John Daly ou Vijay Singh e mesmo de assumidos “conservadorões” como Tom Watson ou Kenny Perry, o próprio Jesper Parnevik, o jogador que apresentou Elin Nordgren a Tiger – e que o criticou com absoluta brutalidade logo a seguir ao rebentamento do escândalo – já foi citado congratulando-se com o seu regresso. É natural: Tiger não joga deste o Australian Masters – e, desta então, as atenções dos adeptos de golfe andaram sempre mais centradas na vida pessoal do jogador do que nos torneios que, na sua ausência, iam decorrendo um pouco por todo o lado. Pelo contrário, o entusiasmo do público parece agora de novo canalizado para os fairways. Dois dias depois do anúncio do regresso de Tiger, feito no dia 16, já havia bilhetes para o The Masters (que custavam 200 dólares) à venda na Internet por 2400.

Não será fácil a Tiger ganhar a prova. Após quatro meses e meio sem uma única ronda competitiva – e ainda por cima tratando-se este de um jogo mentalmente exigente, ao longo do qual se vão misturando todo o tipo de emoções –, Woods deverá sobretudo tentar passar o cut e acabar a prova com dignidade. Mas o facto é: se alguém alguma vez pode vencer num contexto destes, esse alguém é Tiger. Por isso mesmo, a casa de apostas britânica William Hill apressou-se a colocá-lo no topo dos favoritos para Augusta, com odds de 4/1. E por isso mesmo também hão-de estar já algo receosos todos aqueles que, apesar de tudo, vão furando a unanimidade, dispersando pelos jornais de todo o mundo acusações segundo as quais o regresso é “prematuro”, prova o “egoísmo” de Tiger, demonstra que ele se encontra “longe de estar arrependido pelos seus actos” ou mesmo perpetra aqui “um último ataque às mulheres”, escolhendo para o regresso precisamente um torneio disputado no campo de um clube que não aceita senhoras como sócias.

As críticas, naturalmente, hão-de continuar, principalmente se o caddie Steve Williams (que o condenou em público) não o acompanhar, se Elin Nordgren não aparecer em Augusta e, sobretudo, se o resultado final de Tiger for mau. Mas, lentamente, a poeira começará a assentar, passando a circunscrever-se às paródias clássicas a escândalos como este, incluindo as referências e as sátiras nos programas televisivos de humor (como “South Park”, mas não só), a criação de produtos eróticos colados à imagem do traidor apanhado ou mesmo a revelação de novos pormenores sobre o escândalo em causa (como a publicação de sms eróticas do jogador, feita um dia destes por mais uma das suas muitas auto-proclamadas amantes). No fim, porém, tudo não passará de uma nota de pé de página. Tiger não é apenas o melhor golfista da sua geração: é talvez o melhor dos mais de 250 anos da história moderna deste jogo. E a analogia é inevitável: também muitos dos que mais cercaram Clinton depois do escândalo Lewinski acabaram, durante a presidência de Bush, por sentir saudades do ex-presidente.

 

TIGER RETURNS

Há muitos anos que a relação entre Tiger Woods e o The Masters Tournament é especial. Realizado desde 1934 no campo do Augusta National Golf Club, na Geórgia (EUA) – de resto desenhado a meias entre Alister MacKenzie e o dito “melhor amador de todos os tempos”, Bobby Jones –, o torneio conheceu um dos seus momentos mais altos de sempre quando serviu de palco à primeira das actuais 14 vitórias de Tiger em majors, em 1997, ano em que Woods acabou o front nine da primeira ronda com +4, fez -6 no back nine e foi cavando para os adversários uma vantagem colossal, que no final se situou em doze pancadas (-18, contra o -6 do segundo classificado, Tom Kite). Ao todo, Tiger venceu ali quatro vezes. No ano passado, e com as bancadas torcendo em delírio por Kenny Perry, ganhou Ángel Cabrera, que suplantou Perry e Chad Campbell num playoff.

 

THE MASTERS TOURNAMENT

1º major da temporada

CAMPO: Augusta National

CIDADE: Augusta (Geórgia, EUA)

DATAS: de 8 a 11 de Abril

SANÇÕES: PGA, European Tour e Japan Golf Tour

PRIZE MONEY: 7 milhões de dólares (€ 5,2 milhões)

CAMPEÃO EM TÍTULO: Ángel Cabrera (Argentina)

JOGADORES COM MAIS VITÓRIAS: Jack Nicklaus (6); Arnold Palmer e Tiger Woods (4); Jimmy Demaret, Sam Snead e Gary Player (3); Horton Smith, Ben Hogan, Tom Watson, Severiano Ballesteros, Nick Faldo, Bernhard Langer, José Maria Olazábal, Ben Crenshaw e Phil Mickelson (2)

FIELD (TOTAL DE CERCA DE 95 JOGADORES): antigos campeões do torneio; últimos cinco vencedores do US Open, do British Open e do PGA Championship; últimos três vencedores do The Players Championship; primeiros dois classificados do último US Amateur; vencedor do último British Amateur; vencedor do último Asian Amateur; vencedor do último US Amateur Public Links; vencedor do último US Mid-Amateur; primeiros 16 classificados da última edição do torneio; primeiros oito classificados do último US Open; últimos quatro classificados nos últimos British Open e PGA Championship; top da PGA Tour Money List do ano anterior; vencedores dos torneios pontuáveis para o The Tour Championship do ano anterior; todos os jogadores qualificados para o The Tour Championship do ano anterior; primeiros 50 classificados do ranking mundial; convidados internacionais.

 

CRONOLOGIA DE UM ESCÂNDALO

25 de Novembro

O The National Inquirer revela que Tiger Woods tem andado a trair a mulher com uma mulher chamada Rachel Uchitel.

27 de Novembro

Na noite de Acção de Graças, Tiger Woods estampa o seu Cadillac Escalade contra uma bomba de incêndio e uma árvore nos jardins em frente à sua mansão de Windermere, na Florida. A imprensa noticia que Elin Nordgren, sua mulher, o agredira com um taco de golfe.

29 de Novembro

Tiger emite um comunicado em que se responsabiliza a si próprio pelo acidente, defendendo a mulher como a pessoa que o ajudou. Entretanto, pede respeito pela sua privacidade.

30 de Novembro

O jogador anuncia que não disputará o Chevron Golf Heritage, que beneficia a sua própria obra de caridade, e que não voltará a participar em torneios até ao final do ano.

1 de Dezembro

Uma segunda mulher, Jaimee Grubs, revela publicamente ter sido amante de Tiger. No mesmo dia, a polícia da Florida multa o jogador em 164 mil dólares por condução descuidada.

2 de Dezembro

Rachel Uchitel faz publicar na US Weekley uma mensagem telefónica de Tiger pedindo-lhe para despersonalizar o voicemail, prevenindo-se contra um eventual telefonema de Elin. No mesmo dia, o site oficial do jogador publica um comunicado em que este, implicitamente, pede pela primeira vez desculpa por ter traído a mulher.

3 de Dezembro

O sueco Jesper Parnevik, que apresentara Elin a Tiger, diz publicamente que pensava que o número 1 mundial “era melhor homem do que na verdade é”, instando ao mesmo tempo a compatriota a “da próxima vez, usar o driver em vez da madeira 3”.

7 de Dezembro

Holly Sampson, estrela porno, torna-se na sétima mulher a reclamar-se amante de Tiger Woods.

8 de Dezembro

É divulgada a notícia de que Elin acaba de comprar uma casa na Suécia, no valor de dois milhões de dólares.

11 de Dezembro

Tiger emite novo comunicado, anunciando agora que abandona “por tempo indeterminado” o golfe, passando concentrando-se na resolução dos problemas no seu casamento.

14 de Dezembro

A consultora Accenture torna-se no primeiro grande patrocinador a abdicar de Tiger, em virtude “das circunstâncias das últimas duas semanas”.

16 de Dezembro

A revista People diz que Elin já informou a família e os amigos da sua intenção de deixar Tiger Woods.

30 de Dezembro

Tiger Woods faz 34 anos.

31 de Dezembro

O banco AT&T torna-se no segundo patrocinador a romper o contrato com Tiger Woods.

19 de Janeiro

É divulgada a notícia de que Tiger está em terapia sexual numa instituição de Hattiesburg, no Mississippi.

27 de Janeiro

Phil Mickelson vem pela primeira vez a público defender a importância do regresso de Tiger ao golfe, declarando entretanto ser “um bom amigo” tanto do jogador como da mulher.

5 de Fevereiro

É divulgada a notícia de que Tiger concluiu a terapia sexual marcada para Hattiesburg.

12 de Fevereiro

É divulgada a notícia de que Tiger acaba de comprar o iate Solitude, no valor total de dois milhões de dólares, para oferecer à mulher.

19 de Fevereiro

Enquanto se disputa o Accenture Match Play Championship, patrocinado pelo primeiro sponsor a abandoná-lo, Tiger convoca uma conferencia de imprensa para TPC Sawgrass, durante a qual se diz “profundamente arrependido” pelos seus actos, nega a ocorrência de qualquer episódio de violência doméstica durante a Acção de Graças e garante que tão depressa não voltará a jogar.

23 de Fevereiro

Tiger envia aos pais dos colegas de escola dos filhos uma carta em que se penitencia pelo mau exemplo dado.

26 de Fevereiro

A Gatorade torna-se no segundo patrocinador a cortar parcialmente no apoio a Tiger, imitando o exemplo prévio da Gillette.

28 de Fevereiro

Tiger regressa a casa, declarando estar agora concentrado no treino físico e técnico. Começam as especulações sobre quando ocorrerá o seu regresso.

3 de Março

Steve Williams, caddie de Tiger desde 1999, anuncia estar “obviamente furioso” com o patrão, desmentindo ao mesmo tempo ter qualquer conhecimento das suas actividades mundanas.

11 de Março

A Associated Press noticia que Tiger regressará durante o The Masters Tournament, marcado para Abril em Augusta.

16 de Março

Tiger confirma a informação da Associated Press: o seu regresso ocorrerá efectivamente durante o primeiro major da temporada.

17 de Março

Josyln James, a enésima auto-proclamada amante de Tiger Woods, revela uma mensagem telefónica em que Tiger diz qualquer coisa como: “Quero tratar-se à bruta. Quero atirar-te pelos cantos, espancar-te e dar-te palmadas. Quero prender-te ao chão enquanto te estrangulo.”

18 de Março

A produtora Comedy Central apresenta um episódio de “South Park” inspirado no caso de Tiger, juntando-se ao imenso rol de sátiras realizadas desde Dezembro (incluindo anedotas, jogos de computador e gadgets sexuais).

FEATURE. J (O Jogo), 28 de Março de 2010

publicado por JN às 10:38
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21 Março 2010

“Era como se a minha vida dependesse disto”, respondeu Alexandre Rocha. À sua frente estendiam-se algumas das muitas dezenas de jornalistas que se haviam reunido no Champion Course do PGA National Golf Resort & Spa, na cidade de Palm Beach Gardens (Florida, EUA), para assistir a mais uma edição do Honda Classic, importante etapa da FedEx Cup no caminho para o The Masters Tournament. A pergunta era simples: “Diz que precisava de uma ronda destas. Consegue precisar o quanto precisava dela?” Reposta: “Era como se a minha vida dependesse disto. E uma coisa posso garantir: este resultado não é para dedicar a mais ninguém – é para dedicar-me a mim próprio.”

Não admira. Quando, em 2000, Alexandre Rocha se mudou para os Estados Unidos, para estudar na universidade de Mississipi State, rapidamente foi integrado na principal formação da equipa All-American, ao lado de nomes hoje tão incontornáveis como os de Paul Casey, Lucas Glover, Charles Howell III, Luke Donald, Matt Kuchar ou Bryce Molder. No ano passado, e depois de dar por perdida a categoria 11 do European Tour, que lhe permitia o acesso a alguns dos torneios mais importantes do circuito, esteve à beirinha de abandonar a prática profissional do golfe. E só reconsiderou no instante em que, sabida a realização no Rio de Janeiro da Olimpíada de 2016, ficou a saber também que essa seria precisamente a edição em que a modalidade voltaria ao programa (e que, aliás, o próprio Comité Olímpico Internacional pretendia convencê-lo a abdicar da ideia de desistir).
Hoje, volta a ser nele que o Brasil mais aposta quanto a uma presença nacional no torneio masculino dos Jogos desse ano. Embora Adilson da Silva (número 412 do mundo) tenha dominado o golfe masculino brasileiro ao longo da última década, está agora com 38 anos e parece definitivamente concentrado no obscuro Sunshine Tour. Lucas Lee, brasileiro de ascendência coreana, vai começando a fazer carreira no Asian Tour, mas continua na posição 595 do ranking – e, de resto, ainda é muito jovem (22 anos), estando ainda longe da maturidade. Rafael Barcellos venceu o Open do Brasil em 2008, mas a prova (que nem sequer se realizou em 2007 e 2009) não pertence agora a nenhum circuito, pelo que o jogador nem sequer aparece no ranking global. E o mesmo, de resto, se passa com Ronaldo Francisco (ao lado do qual Barcellos representou o Brasil na Taça do Mundo de 2009), cujo triunfo no LG Vivo PGA Championship de 2010 não foi mais do que um brilharete interno.
Pelo contrário, Alexandre Rocha como que renasceu naquele dia na Florida. O Honda Classic foi apenas o seu quarto torneio do PGA Tour, de resto o primeiro desde 2003 – e, para lá chegar, o jogador brasileiro teve de passar uma pré-qualificação, uma longa qualificação oficial e ainda um playoff. Mas entrou no field, suplantou finalmente um cut, acabando a prova no 59º lugar final, com mais de doze mil dólares de prémio – e, sobretudo, brilhou a grande altura no primeiro dia do torneio (66 pancadas, 4 abaixo do par do campo), em que apenas o australiano Nathan Green e o americano Michael Connel fizeram melhor (-5). Dezenas de jogadores do primeiro plano mundial, incluindo Pádraig Harrington, Sergio García, Angel Cabrera, Justin Rose, Vijay Singh, Paul Casey, J.B. Holmes, Justin Leonard ou Mike Weir, entre tantos outros, fizeram pior ou muito pior nesse dia (o detentor do título, Y.E. Yang, fez 79). E estrelas tão brilhantes como Tim Clark, Andres Romero, David Duval, Ben Curtis, Bill Haas ou Woody Austin nem sequer conseguiram chegar ao fim-de-semana, falhando o cut.
“Fiquei surpreendido com a calma e a auto-confiança que senti em campo”, diria Alexandre Rocha no final. “Não estou surpreendido por ter batido bem na bola. Tenho trabalhado muito nisso – e, aliás, nem sequer é a primeira vez que me acontece. Mas, sobretudo, fiquei surpreendido por ter-me sentido bem.” Na sua primeira e brilhante ronda, e apesar de momentos de sorte como aquele em que fez um pull no tee shot do buraco 7 (vendo a sua bola sair out-of-bounds e de repente regressar para o meio do fairway, depois de bater em alguma coisa dura), Alexandre fez muitos greens in regulations, enfiou putts longuíssimos para salvar pars e, principalmente, nunca perdeu a compostura perante as dificuldades com que se deparou. E, embora tenha piorado a sua prestação ao longo dos dias subsequentes (66-76-71-74, num total de +7), o facto é que aquele primeiro dia, em que concentrou a atenção dos media internacionais (que lhe chamaram sempre “Alex Rocca”, por uma questão de facilidade), já ninguém lho tira.
Para o golfe brasileiro, foi uma vitória. Posto nas bocas do mundo em resultado do privilégio de fazer de palco ao regresso do jogo às Olimpíadas, o Brasil já tinha os campos (cerca de 110, por esta altura), ainda tinha alguma tradição (nomeadamente seis décadas de Brazil Open, onde venceram jogadores como Sam Snead, Billy Casper, Gary Player, Raymond Floyd, Jarry Pate ou Hale Irwin, para além dos sul-americanos Roberto de Vicenzo ou Angel Cabrera), mas quase não tinha bons jogadores para apresentar desde que Mário Gonzalez abandonara a competição. Nascido em 1939, em Santana do Livramento, Rio Grande do Sul, Gonzalez venceu nove vezes o Campeonato Amador Brasileiro e oito vezes Brazil Open (no qual bateu, por exemplo, Roberto de Vicenzo), conquistando ainda vitórias em países tão diversos como a Argentina e o Uruguai, a Espanha e a Inglaterra, os Estados Unidos e mesmo Portugal. E nunca o Brasil conseguiu encontrar um substituto à sua altura.
No sector masculino, isto é. Porque no sector feminino há já algum tempo que o país tem algum destaque internacional, nomeadamente através de Ângela Park, outra descendente de coreanos que joga agora no LPGA Tour americano, onde ainda não venceu mas já conseguiu 18 top tens (incluindo um segundo lugar no US Women’s Open de 2007) e ganhou para cima de dois milhões de dólares só em prize money. Mas o problema é que, como acontece de alguma forma com Adilson da Silva (que cresceu na África do Sul e jogou quase sempre entre a África e a Europa) e Lucas Lee (que não tardou em mudar-se para a Ásia, onde, até por causa da cor da sua pele, é tido sobretudo como um asiático), Ângela Park é apenas parcialmente brasileira. Nasceu junto às cataratas da Foz de Iguaçú, filha de comerciantes imigrados da Coreia do Sul, mas aos oito anos já estava a viver na Califórnia, apenas jogando agora sob bandeira brasileira em resultado das diligências da Confederação Brasileira de Golfe.
Alexandre Rocha, não: Alexandre Rocha é brasileiro puro e duro, como antigamente se era brasileiro, português, francês ou australiano – é brasileiro nado, iniciado ao golfe e feito adulto. Nascido em 1977 (32 anos) em São Paulo, no seio de uma família de classe média-alta verdadeiramente obcecada pelo jogo, cresceu dentro do São Fernando Golf Club, onde os pais haviam construído casa. Em 2000, quando se mudou para o Mississipi, não falava uma só palavra de inglês – e, entre os restantes jogadores dos diferentes circuitos que já integrou, sempre foi “o brasileiro”, muito mais do que “um jogador que joga pelo Brasil”. Pois hoje, e apenas duas semanas depois de ostentar a posição 711 do ranking mundial, já está nos 400 primeiros (395º), à frente mesmo de algumas estrelas que todas as semanas vemos desfilar nos torneios do European Tour e do PGA Tour, via SportTV Golfe. Ainda não recuperou o seu cartão da primeira divisão do circuito europeu, dividindo-se agora entre o Challenge Tour e o Asian Tour, em que se inscreveu logo depois de voltar atrás com a decisão de abandonar o golfe. Mas, por esta altura, já sonha com os Jogos Olímpicos de 2016 – e, pela primeira vez em vários anos, o Brasil sonha com ele.

 


O GOLFE NO BRASIL

O golfe brasileiro é agora aproximadamente da dimensão do golfe português, ele próprio em franco desenvolvimento. Mas o país é enorme, a atenção do mundo é enorme também – e o novo projecto Golfe Nota 10, aliado ao crescimento do número de campos e driving ranges públicos ou semi-públicos, bem pode vir a dar resultados

ORIGEM: já existiam diversos campos de golfe no Brasil quando, em 1957, o Royal & Ancient Golf Club of Saint Andrews e a United States Golf Association decidiram organizar um campeonato do mundo e convidaram Seymour G. Marvin a representar o Brasil; foi então criada a Associação Brasileira de Golfe, hoje chamada Confederação Brasileira de Golfe (composta por oito federações estaduais ou regionais).
JOGADORES: o Brasil dispõe actualmente de cerca de 20.000 amadores activos, o que representa um aumento cerca de 300 % em dez anos.
CAMPOS: ao longo de todo o país, e em resultado também do aumento do número de condomínios de férias, são já 110 os campos de golfe, o que significa aumento de cerca de 40 % em dez anos
PROJECTOS PARA NOVOS CAMPOS: de Norte a Sul do país, há entre 30 e 40 novos campos planeados, a maior parte deles englobados no desenvolvimento da rede de condomínios do Nordeste.
CASH FLOW ANUAL: entre a prática de locais, o turismo e a alta competição, o golfe brasileiro movimenta agora cerca de 500 milhões de reais (aproximadamente 1,2 milhões de euros).
MEMBERSHIPS E GREENFEES: nos clubes de alto nível, a jóia custa cerca de 100 mil reais (aproximadamente 41 mil euros) e a mensalidade à volta de mil reais (cerca de 414 euros); um greenfee para uma ronda de 18 buracos pode ascender a 210 euros.
DESENVOLVIMENTO DO GOLFE: são já cerca de 20 os campos e driving ranges públicos ou semi-públicos brasileiros, criados com a intenção de captar novos jogadores; a Confederação Brasileira de golfe avançou também, nos últimos anos com a feira Brasil Golf Show e com o programa Golfe Nota 10, destinado à juventude (e para o qual já conseguiu garantir o apoio do Crédit Suisse e da Akzo Nobel).
GRANDES MOMENTOS DO PASSADO: o Brazil Open disputa-se desde 1945, embora com algumas interrupções, tendo já premiado jogadores como Sam Snead, Roberto de Vicenzo, Billy Casper, Gary Player, Raymond Floyd, Jarry Pate, Hale Irwin ou Angel Cabrera; Pádraig Harrington venceu o mega torneio Brazil São Paulo 500 Years Open, em 2000.

FEATURE. J, 21 de Março de 2010

publicado por JN às 23:46
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14 Março 2010

Começou por ser o sonho de um homem só, mas ao fim de escassos cinco anos está já disperso pelo mundo inteiro, Portugal incluído. Desde Novembro passado que uma dezena de campos de golfe do Algarve dispõem do Shadow Caddy, o novo trolley robótico que segue o jogador para todo o lado como um cãozinho – e o homem que o trouxe para Portugal, Tom Olthof, pretende agora atacar em força os mercados da Grande Lisboa, do Grande Porto e de diferentes regiões de Espanha, na esperança de ter já cobertos 60 campos da Península Ibérica até ao final do ano.
“Com a crise económica generalizada, de resto com graves implicações no sector do turismo, sobreviver depende também disto: de sermos capazes de criar novos serviços que possam ajudar a fidelizar os golfistas estrangeiros que nos visitam”, diz Olthof, um cidadão holandês há muito radicado em Portugal. “Portugal tem o melhor conjunto de campos da Europa, mas precisa de jogadores. Ora, o pior que se pode fazer quanto a isso é enfiar a cabeça na areia, como a avestruz. E o Shadow Caddy é uma iniciativa importante para combater a recessão no sector.”
A ideia nasceu de Hubert Novak, um engenheiro e golfista australiano que há uns anos começou a sofrer de problemas nas costas e de imediato começou à procura de uma solução. Resultado: um robô que faz tudo aquilo que se costumava pedir aos caddies humanos, figura entretanto circunscrita a uns quantos velhos country clubs. Ligado ao jogador através de um radiotransmissor que este traz apenso ao cinto, o Shadow Caddy segue o jogador à distância de um metro e meio – e, naturalmente, carrega ele próprio os tacos, permitindo ao golfista desfrutar do passeio e do jogo com maior conforto.
Trata-se, na verdade, de um pequeno prodígio de engenharia. Projectado em 2005 e lançado no mercado australiano apenas três anos depois, o Shadow Caddy é cem por cento robótico, tem autonomia suficiente para 40 buracos, é capaz de subir ladeiras com 30% de inclinação e resiste tanto ao sol como à chuva, tendo sido testado nas condições atmosféricas mais extremas. No momento em que vai entrar num green ou num bunker, o jogador limita-se a premir um botão, obrigando-o a parar até que volte a accioná-lo. E um conjunto de seis dispositivos de infra-vermelhos permitem-lhe, entretanto, evitar o choque com qualquer tipo de objectos, incluindo árvores, bancos de jardim ou mesmo as pernas dos jogadores.
“É um produto cinco estrelas, que se adapta a golfistas de todos os níveis e de todas as idades”, sublinha Tom Olthof. “A ideia é permitir aos amadores praticarem a modalidade exactamente como os profissionais, concentrando-se em exclusivo no jogo e deixando as tarefas mais comezinhas a cargo de uma segunda entidade, que por acaso é um robô. Estou convencido de que o Shadow Caddy será importantíssimo para convencer as pessoas a jogarem as suas rondas de golfe a pé, fazendo exercício físico e, inclusive, melhorando o seu score. O que é válido para jovens, mas também para seniores – talvez até sobretudo para estes.”
O modelo de negócio não está especialmente vocacionado para a venda a retalho, visto o gadget pesar 65 kg e ser pouco cómoda de transportar. Um jogador que more junto a um campo de golfe pode efectivamente adquirir uma unidade, à venda por € 4950. Tal como a australiana Shadow Caddy Company ou qualquer outra das subsidiárias ao redor do mundo, porém, a Shadow Caddy Iberia aposta sobretudo na concessão de unidades aos campos, que explorarão a máquina eles próprios, cabendo depois uma parte das receitas à empresa proprietária. O valor de aluguer aconselhado para uma ronda de 18 buracos situa-se entre os € 15 e os € 25. A maior parte dos campos algarvios que já o disponibilizam está a cobrar € 20.
“Em Vale de Lobo, por exemplo, tem sido um sucesso. Os clientes alugam-nos bastante e saem sempre satisfeitos”, diz Olthof. “Infelizmente, isso não tem acontecido em todos os campos. Há clientes que não chegam sequer a saber da existência do Shadow Caddy. Outros alugam-no, mas vêm a verificar que ele está sem bateria ao fim de alguns buracos. Nem todos os campos estão, portanto, a geri-lo bem. Os caddy masters são essenciais nisto. Mas estou em crer que, com o tempo, a situação será resolvida.” Para além disso, acrescenta o importador, em breve a chuva terá acabado, permitindo a muitos outros jogadores deixarem de precisar de um buggy para se refugiarem dela.
“Uma maneira melhor de jogar golfe”, diz um dos slogans da campanha de lançamento mundial, entretanto já alargada a países tão díspares como os Estados Unidos e o Canadá, a Alemanha e a França, a África do Sul e a Nova Zelândia, a Coreia do Sul, a China e o Japão. No futuro, a Shadow Caddy Iberia espera estar presente em todos os mais de 350 campos campionship da Península Ibérica. “No ano passado fizemos uma série de demonstrações e testes junto do público. O impacte foi sempre impressionante. O Shadow Caddy é uma máquina que provoca as reacções mais diversas, incluindo a simples curiosidade, o mais profundo espanto e as gargalhadas mais divertidas. Mas nunca deixa de originar imenso carinho”, diz Tom Olthof. O apoio do Conselho Nacional da Indústria do Golfe, entretanto já oficializado, pode vir a ser essencial para a criação de uma nova tendência na forma como se joga golfe em Portugal.

 

UM GADGET DO SÉCULO XXI

Desenvolvido em apenas três anos, o robô inventado por Hubert Novak, o primeiro caddy completamente mãos-livres do mundo, é um pequeno prodígio da engenharia. Para breve está prometida a instalação de tecnologia GPS, primeiro para a monitorização da máquina e mais tarde para o próprio planeamento do jogo.

- Tecnologia 100% robótica
- Operação através de radiotransmissor (duas antenas)
- Autonomia de 40 buracos
- Capacidade para subir inclinações até 30º
- Resistência a todas as condições atmosféricas
- Seis sensores infra-vermelhos anti-colisão
- Sentidos avante e marcha-atrás
- Baterias de 24 volts
- 2 motores individuais, com 180 w e 4000 rpm
- Velocidade máxima até 8 km
- Travão individual em cada roda
- Display electrónico com tecnologia LCD
- Controlador de movimentos CMC, com velocidade de processamento até 200 vezes/segundo
- Interruptor de segurança
- 65 kg de peso

 

 

32 UNIDADE EM 10 CAMPOS

É nos campos de Vale de Lobo que o Shadow Caddy tem atingido maior sucesso. Mas são já 10 os campos algarvios que permitem o seu aluguer, num total de 32 unidades colocadas no terreno em apenas três meses). O aluguer custa, habitualmente, € 20 por cada ronda de 18 buracos.

OCEAN VALE DE LOBO (Vale de Lobo): 4 (em partilha com o campo Royal)
ROYAL VALE DE LOBO (Vale de Lobo): 4 (em partilha com o campo Ocean)
PINHEIROS ALTOS (Quinta do Lago): 4
QUINTA DA RIA (Tavira): 4 (em partilha com o campo Quinta de Cima)
QUINTA DE CIMA (Tavira): 4 (em partilha com o campo Quinta da Ria)
BENAMOR (Tavira): 4
QUINTA DO VALE (Castro Marim): 4
PINE CLIFFS (Albufeira): 4
PENINA (Portimão): 4
VALE DA PINTA (Carvoeiro): 4

 

NÃO CONDUZA: CAMINHE!

Usar um Shadow Caddy em vez de um buggy permite, para além de uma concentração suplementar no jogo propriamente dito, um exercício físico muito mais completo do que aquele que é praticado ao volante. Com uma série de benefícios para a saúde, naturalmente.

- Redução dos riscos de doenças coronárias
- Redução da tensão arterial e do colesterol
- Manutenção física e diminuição do risco de obesidade
- Aumento da densidade óssea, com prevenção da osteoporose
- Redução dos riscos de cancro no cólon e da mama
- Redução dos riscos de diabetes
- Melhoria da flexibilidade e da coordenação muscular
- Reforço do bem-estar mental

FEATURE. J, 14 de Março de 2010

publicado por JN às 23:23
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joel neto

Joel Neto nasceu em Angra do Heroísmo, em 1974. Publicou “O Terceiro Servo” (romance, 2000), "O Citroën Que Escrevia Novelas Mexicanas” (contos, 2002), “Al-Jazeera, Meu Amor” (crónicas, 2003) e “José Mourinho, O Vencedor” (biografia, 2004). Está traduzido em Inglaterra e na Polónia, editado no Brasil e representado em antologias em Espanha, Itália e Brasil, para além de Portugal. Jornalista, tem trabalhado... (saber mais)
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