ler mais...
19 Julho 2009

Não, não é apenas uma quimera de dois ou três lunáticos: a candidatura portuguesa à organização da Ryder Cup 2018 não só foi já aceite pela Ryder Cup Europe, como já tem logótipo oficial – e, aliás, avança nas próximas semanas para a rua, com a recepção a Richard Hill, director do comité europeu da competição, e as primeiras reuniões destinadas elaborar o plano de pormenor do projecto. Os concorrentes, já se sabe, são cinco – e são de peso. Espanha, França, Holanda, Alemanha e Suécia têm mais campos, mais praticantes e, de resto, muitos mais títulos internacionais acumulados ao longo da história do golfe. Mas Portugal tem os galardões turísticos (o Algarve foi considerado o melhor destino golfístico do mundo em 2007 e Lisboa o melhor da Europa em 2008), bastante experiência organizativa (80 torneios profissionais desde os anos 70, incluindo a World Cup 2005) e um clima a que apenas o de Espanha poderá comparar-se. Com uma vantagem: o país vizinho, que é a maior potência continental da modalidade, já foi o anfitrião do torneio de 1997, na única vez que a Ryder Cup se disputou fora das ilhas britânicas e dos Estados Unidos.
Fundada em 1927 pelo inglês Samuel Ryder, empresário e entusiasta de golfe, a Ryder Cup é uma competição que opõe bianualmente, e em diferentes formatos de Match Play, os doze melhores jogadores europeus aos seus congéneres norte-americanos, num encontro realizado alternadamente na “casa” de uns e dos outros. Começou por colocar em confronto apenas os Estados Unidos e a Inglaterra, mas a formação deste lado do Atlântico alargou-se sucessivamente à Grã-Bretanha e à Europa em geral – e, depois de, ao longo de anos se ter discutido a necessidade de presentear o continente com a recepção a um torneio, a prova de 1997 acabou por ser atribuída ao campo de Valderrama, junto a Cádiz, na Andaluzia. Pois em 2018, e depois de mais quatro edições nas ilhas britânicas (incluindo na República da Irlanda, em 2006, na única outra vez que saiu do Reino Unido sem ser para os Estados Unidos), a Ryder Cup volta à Europa Continental. E Portugal, cujo prestígio como organizador de eventos desportivos (incluindo golfísticos) vem crescendo de ano para ano, não quer perder a oportunidade de pelo menos tentar chegar ao papel de anfitrião, oferecendo-se para disponibilizar as praias do Algarve (a competição realiza-se sempre em Setembro) aos adeptos que habitualmente se deslocam para acompanhar a competição.
A candidatura tem a curiosidade de ser, de alguma forma, rival da proposta de recepção ao Campeonato do Mundo de Futebol de 2018, pois em nenhum caso a Ryder Cup Europe atribuirá a organização do evento ao mesmo país que receber o Mundial. Mas a Espanha, que forma com Portugal uma candidatura conjunto no futebol, também avançou no golfe – e, de resto, os timings de decisão não são os mesmos. Todos os seis países interessados na Ryder Cup 2018 terão de entregar os seus dossiers até 30 de Abril de 2010. A decisão sobre o vencedor, porém, apenas será anunciada algures na Primavera de 2011 – e, por essa altura, já se sabe quem organizará o Campeonato do Mundo de Futebol, que será atribuído oficialmente em Dezembro do próximo ano. Mais: mesmo que derrotadas, ambas as candidatura têm vantagens em si próprios, chamando a atenção para as potencialidades do país e colocando-o na rota de futuras organizações. Assim que foi anunciado como candidato à Ryder Cup, por exemplo, Portugal (ou os campos da Oceânico Developments na Amendoeira, mais concretamente) tornou-se de imediato o destaque turístico do site oficial do norte-americano PGA Tour, onde se chamava ao Algarve “um fenómeno golfístico único no mundo”.
Um dos obstáculos a vencer, naturalmente, tem a ver com a composição do Governo. Enquanto foi ministro da Economia, Manuel Pinho, por sinal um ávido golfista, manteve o golfe no top 10 dos sectores estratégicos para a economia nacional, apoiando política e pessoalmente a realização da World Cup de 2005 e cada um dos torneios internacionais realizados desde 2004 em Portugal. Primeiro problema: não há qualquer garantia de que Teixeira dos Santos, o novo ministro da tutela, tenha pela modalidade (e pela sua indústria) o mesmo carinho do antecessor. Segundo: também não há qualquer garantia de que o Partido Socialista revalide a titularidade do Governo nas eleições deste Outono. Terceiro: mesmo que o PS ganhe as eleições, é ainda desconhecido ministro que se ocupará da pasta da Economia para o próximo quadriénio. Para já, só Manuel Pinho, que pouco antes da demissão se referiu à intenção de candidatura durante uma edição do programa Prós&Contras, da RTP1, manifestou apoio expresso ao projecto. Laurentino Dias, secretário de Estado do Desporto, aderirá rapidamente. Mas não chega: as grandes organizações, no que diz respeito ao golfe, são normalmente realizadas via Turismo de Portugal, que é da tutela directa do Ministério da Economia.
Em todo o caso, a candidatura em causa é da responsabilidade da Federação Portuguesa de Golfe (o Governo apenas a apoiará), de acordo com as regras definidas pela Ryder Cup Europe. E a FPG tem argumentos de peso para tentar persuadir o futuro ministro da Economia a juntar-se-lhe na causa. Com menos de 80 campos e pouco mais de vinte mil jogadores federados, o golfe português motiva a visita de 300 mil turistas por ano, vendendo 1,4 milhões de volta, fazendo ocupar 1,1 milhões de camas e originando uma receita de cerca de 7,5 mil milhões de euros. Mais: há três anos, quando se realizou na Irlanda, a Ryder Cup teve um impacte directo na economia irlandesa equivalente a 240 mil milhões de euros. Embora não permita vender muito mais de 50 mil bilhetes por dia (os jogos concentram-se em cinco ou seis buracos consecutivos, pelo que é possível espalhar o público pelo recinto), a competição é o terceiro evento desportivo mundial com mais público televisivo, chegando a mais de mil milhões de pessoas (e 56 milhões de golfistas/potenciais turistas) em 150 países diferentes. Daí que Manuel Agrellos, presidente da Federação, se refira à candidatura como “um imperativo nacional”, de acordo com o que se lê no seu artigo no mais recente número na revista “Golf Digest”, órgão oficial da FPG.
O processo acelera ao longo deste Verão. O investimento global está longe de se encontrar definido, mas ficará, naturalmente, muito aquém dos montantes exigidos, por exemplo, pelo Euro 2004. No máximo, será preciso construir um campo de golfe, sempre muito mais barato do que um estádio. Na FPG, acredita-se que campos como o do Victoria (Vilamoura, palco do Portugal Masters), do Monte Rei (Vila Nova de Cacela, Tavira), ou ainda o Faldo Couse (Amendoeira, Silves) poderiam ser adaptados a uma prova da grandeza da Ryder Cup, mas também que a criação de um circuito de raiz seria mais prestigiante para a candidatura. Entretanto, será preciso constituir uma empresa (provavelmente chamada Ryder Cup Portugal). A recolha de apoios entre jogadores estrangeiros (tal como entre as federações britânicas) não deverá ser uma prioridade, pois é improvável que algum deles (e delas) venha a tomar partido por um dos concorrentes. Condição essencial à vitória no concurso será o arranque em Portugal de um torneio do Challenge Tour: Portugal tem três torneios no European Tour (Portugal Masters, Open de Portugal e Madeira Islands Open), um no Seniors Tour e um no Ladies European Tour, mas não tem nenhum na segunda divisão europeia, circunstância que a Ryder Cup Europe já definiu como decisiva.
A próxima edição da Ryder Cup, a 38ª, está agendada  para o Celtic Manor Resort, em Newport, no País de Gales (1 a 3 de Outubro de 2010), onde os capitães Colin Montgomerie e Corey Pavin tentarão, respectivamente, recuperar a taça para a Europa e conservá-la nos Estados Unidos. A edição de 2018 será a 42ª. Até lá, a Federação portuguesa tem a esperança de ver afirmar-se Filipe Lima e/ou florescer um dos muitos jovens que têm vindo a despontar a nível internacional (Pedro Figueiredo à cabeça), de forma a poder contribuir também com um jogador para a formação.


OS MAIORES ESPECTÁCULOS DESPORTIVOS DO MUNDO

1º JOGOS OLÍMPICOS(de 4 em 4 anos): 3,7 mil milhões de espectadores
CAMPEONATO DO MUNDO DE FUTEBOL (de 4 em 4 anos): 3,4 mil milhões de espectadores
3º RYDER CUP
(de 2 em 2 anos); 1,1 mil milhões de espectadores


UM LUGAR NA HISTÓRIA
Desde que foi criada por Samuel Ryder, em 1927, a Ryder Cup tem-se disputado quase sempre alternadamente entre os EUA e o Reino Unido (incluindo Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte). Só uma vez se disputou noutro pais britânico (a Irlanda, em 2006) – e, sobretudo, só uma vez se disputou na Europa continental (em 1997, em Espanha). Pois 2018 está há muito reservado para o regresso ao território continental europeu. E é aí que Portugal pretende entrar.
ANO     VENCEDOR    SCORE       CAMPO
2020     ?                      ?               Whistling Straits, Wisconsin, EUA
2018     ?                      ?               Portugal, Espanha, França, Holanda, Alemanha ou Suécia
2016     ?                      ?               Hazeltine National GC, Minnesota, EUA
2014     ?                      ?               Gleneagles Hotel, Perth & Kinross, Reino Unido
2012     ?                      ?               Medinah CC, Illinois, EUA
2010     ?                      ?               Celtic Manor Resort, Newport, Reino Unido    
2008     EUA                16.5-11.5   Valhalla GC, Kentucky, EUA
2006     Europa            18.5-9.5    The K Club, Kildare County, Irlanda
2004     Europa            18.5-9.5    Oakland Hills CC, Michigan, EUA
2002*   Europa            15.5-12.5   The Belfry, Sutton Coldfield, Reino Unido
1999     EUA                14.5–13.5   The Country Club, Massachusetts, EUA
1997     Europa            14.5–13.5   Valderrama, Andaluzia, Espanha
1995     Europa            14.5–13.5   Oak Hill CC, Nova Iorque, EUA
1993     EUA                15–13         The Belfry, Sutton Coldfield, Reino Unido
1991     EUA                14.5–13.5   Ocean Course, Carolina do Sul, EUA
1989     empate           14–14         The Belfry, Sutton Coldfield, Reino Unido
1987     Europa           15–13          Muirfield Village GC, Ohio, EUA
1985     Europa           16.5–11.5    The Belfry, Sutton Coldfield, Reino Unido
1983     EUA               14.5–13.5    PGA National GC, Florida, EUA
1981     EUA               18.5–9.5      Walton Heath, Surrey, Reino Unido
1979     EUA               17–11          Greenbrier, West Virgínia, EUA
1977     EUA               12.5–7.5      Royal Lytham, Lancashire, Reino Unido
1975     EUA               21–11          Laurel Valley GC, Pensilvânia, EUA
1973     EUA               19–13          Muirfield, East Lothian, Reino Unido
1971     EUA               18.5–13.5    Old Warson CC, Misouri, EUA
1969     empate          16–16          Royal Birkdale, Lancashire, Reino Unido
1967     EUA               23.5–8.5      Champions GC, Texas, EUA
1965     EUA               19.5–12.5    Royal Birkdale, Lancashire, Reino Unido
1963     EUA               23–9            East Lake CC, Georgia, EUA
1961     EUA               14.5–9.5      Royal Lytham, Lancashire, Reino Unido
1959     EUA               8.5–3.5        Eldorado CC, Califórnia, EUA
1957     Reino Unido   7.5–4.5       Lindrick GC, Yorkshire, Reino Unido
1955     EUA                8–4            Thunderbird Ranch and CC, Califórnia, EUA
1953     EUA                6.5–5.5      Wentworth, Surrey, Reino Unido
1951     EUA                9.5–2.5       Pinehurst CC, Carolina do Norte, EUA
1949     EUA                7–5             Ganton GC, Yorkshire, Reino Unido
1947     EUA               11–1            Portland CC, Oregon, EUA
1939–45    não se realizou devido à II Guerra Mundial
1937    EUA                 8–4             Southport, Lancashire, Reino Unido
1935    EUA                 9–3             Ridgewood CC, Nova Jérsia, EUA
1933    Reino Unido    6.5–5.5        Southport, Lancashire, Reino Unido
1931    EUA                 9–3             Scioto CC, Ohio, EUA
1929    Reino Unido    7–5             Moortown, Yorkshire, Reino Unido
1927    EUA                 9.5–2.5       Worcester CC, Massachusetts, EUA
* a edição de 2001 foi adiada um ano devido aos atentados do 11 de Setembro

FEATURE. J, 19 de Julho de 2009

publicado por JN às 17:00
tags:

01 Julho 2009

Não vale a pena contestá-lo: os handicaps foram essenciais ao desenvolvimento do golfe. Esta modalidade não é apenas um jogo, é também um palco privilegiado para a sociabilização – e de resto ainda hoje constitui um desporto fundamentalmente amador, por muito que entre os profissionais estejam alguns dos desportistas mais bem pagos do mundo. Portanto, o golfe precisa das classificações net, sem as quais uma boa parte dos jogadores de fim-de-semana simplesmente desertariam. Mas precisará das classificações stableford?
No essencial, o que a classificação stableford nos diz é que se pode dar uma ronda de golfe por concluída sem se ter necessariamente jogado todos os 18 buracos do campo. Não apenas isso, aliás: diz-nos que até se pode ganhar um torneio de 18 buracos sem efectivamente ter concluído esses 18 buracos. É como o Michael Phelps ganhar os 200 metros bruços, mas sem nadar a terceira piscina. Ou o Jenson Button ganhar uma corrida de fórmula 1 fazendo apenas 58 ou 59 das 61 voltas previstas. Ou como eu andar a gabar-me de que levei a Beyoncé Knowles a jantar, quando no fundo apenas fui ver um concerto dela (mas, pronto, saímos juntos, só faltou comermos qualquer coisa).
Mais: com o sistema stableford, um jogador não só pode ganhar um torneio sem efectivamente jogar o campo todo, como pode mesmo ganhar um torneio fazendo incomparavelmente mais pancadas do que o segundo classificado (em net e mesmo em gross). Um faz o campo todo mais ou menos certinho, par ali, bogey ali, duplo acolá; outro faz dois bogeys e um colossal 12 num par 3 em que não consegue sequer passar a bola por cima do lago – e quem ganha? Ganha, muitas vezes, aquele que não passa o lago. E eu acho que um jogador que não passa o lago não pode ganhar o torneio em causa.
Sempre que estou nos Açores, sou desclassificado do primeiro torneio em que participo. Não atino com a saída do buraco 4, onde nem sequer tenho shot de abono – e, quando dou por mim, já levantei a bola. Fico de imediato fora, claro: os torneios são todos em Medal Net. O que nunca me impressionou demasiado, a não ser quando, recentemente, disputei a etapa inaugural do primeiro FedEx Golf Challenge. Estávamos na Penha Longa, ao mesmo tempo o meu campo preferido e aquele em que jogo pior. Efectivamente não joguei nada, com bogey atrás de bogey, e mais bogey ainda, até ao bogey final. Por outro lado, classifiquei-me para a final nacional. Porque o torneio era Medal, claro: havia que completar o campo todo – e, portanto, fazer o parzinho da ordem nos buracos curtos, acumulando pontos stableford, não chegava.
Talvez o stableford seja importante como sistema de referência para o controlo do handicap EGA, mas não é seguramente promotor da excelência. Por mim, acabava já: se não nos torneios sociais, ao menos nas competições a contar para as Ordens de Mérito dos clubes oficiais. Ou isso ou eu fui jantar aqui há dias com a Kylie Minogue, no Pavilhão Atlântico. Se estamos todos autorizados a contar a história cada um à sua maneira, aliás, devo dizer-vos que nem sequer foi só jantar: houve uma festinha no camarim – e depois, com os copos, já se sabe, a Kylie não conseguiu resistir-me.

CRÓNICA DE GOLFE ("Tee Time"). Jornal do Golfe, Julho de 2009

publicado por JN às 08:44

subscrever feeds
pesquisar neste blog
 
joel neto

Joel Neto nasceu em Angra do Heroísmo, em 1974. Publicou “O Terceiro Servo” (romance, 2000), "O Citroën Que Escrevia Novelas Mexicanas” (contos, 2002), “Al-Jazeera, Meu Amor” (crónicas, 2003) e “José Mourinho, O Vencedor” (biografia, 2004). Está traduzido em Inglaterra e na Polónia, editado no Brasil e representado em antologias em Espanha, Itália e Brasil, para além de Portugal. Jornalista, tem trabalhado... (saber mais)
nas redes sociais

livros

"O Terceiro Servo",
ROMANCE,
Editorial Presença,
2000
saber mais...


"O Citroën Que Escrevia
Novelas Mexicanas",
CONTOS,
Editorial Presença,
2002
saber mais...


"Al-Jazeera, Meu Amor",
CRÓNICAS,
Editorial Prefácio
2003
saber mais...


"José Mourinho, O Vencedor",
BIOGRAFIA,
Publicaçõets Dom Quixote,
2004
saber mais...


"Todos Nascemos Benfiquistas
(Mas Depois Alguns Crescem)",
CRÓNICAS,
Esfera dos Livros,
2007
saber mais...


"Crónica de Ouro
do Futebol Português",
OBRA COLECTIVA,
Círculo de Leitores,
2008
saber mais...

arquivos
2011:

 J F M A M J J A S O N D


2010:

 J F M A M J J A S O N D


2009:

 J F M A M J J A S O N D


2008:

 J F M A M J J A S O N D


2007:

 J F M A M J J A S O N D